quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Crónica de um dia no Museu


17 Anos depois eis que fui escalado no serviço do Museu da Carris. Não diria que seja o concretizar de um sonho, mas foi algo que sempre ambicionei, não só pela experiência em si, mas pelo gosto que tenho pela história da Carris e por poder contribuir para que, quem o visita, fique também a conhecer a importância da Carris na própria história da cidade de Lisboa, que cresceu à boleia da expansão da rede do centro para as periferias.

Ao longo dos anos que levo de Carris, tive a oportunidade de poder concorrer a outros cargos que não o de tripulante, como por exemplo o de controlador de tráfego, contudo o gosto pela condução levou-me sempre a deixar essas oportunidade de lado porque sempre achei que poderia dar mais de mim fazendo aquilo que realmente gosto e quando me perguntavam o que gostaria de fazer alem da condução sempre disse que tinha um gosto pela área da formação e pela área museológica da empresa, ainda que nunca tenha tido o devido retorno.


Tive no entanto, a oportunidade de nos últimos anos fazer parte da equipa que leva o museu às ruas de Lisboa por ocasião do desfile anual comemorativo do aniversário da empresa. E de imediato me apercebi que é junto dos veículos históricos que me sinto como peixe na água. Poder conduzir veículos, que se falassem, teriam imensas histórias para nos contar e que nos transportam a épocas passadas é de facto uma experiência enriquecedora, e que nos faz ver e perceber que quem criou estas máquinas eram de facto génios, porque elas continuam a transportar-nos no presente a verdadeiras viagens ao passado. 

Assim, esta quarta-feira tive a oportunidade, de em conjunto com a equipa fixa e administrativa do museu, fazer parte de... "um dia no museu" e não posso deixar de partilhar aqui convosco esta experiência.

Pelas 10h00 recebemos os primeiros visitantes, alunos do colégio moderno que vieram conhecer a história da Carris e como eram os transportes nos tempos em que os pais tinham as suas idades. À entrada para o eléctrico que os levaria ao núcleo 2, muitos já sabiam que quem os iria conduzir era o guarda-freio, fruto da atenção que tiveram à visita guiada pelo núcleo 1. Chegados ao espaço onde estão expostos os veículos, já estava mais um grupo a dar entrada no núcleo 1, e desta feita eram colaboradores e futuros colaboradores da Carris. 

Entre grupos e turistas tive também a oportunidade de trocar umas impressões com um reformado da Carris que com a esposa veio recordar outros tempos. Terminou a sua função na Carris como controlador de tráfego em 2004 e dizia-me com orgulho e brilho nos olhos que foram os melhores anos da sua vida. A esposa concordava e dizia que tinha "começado a trabalhar e no dia seguinte já estava em casa porque a empresa lhe tinha dado o dia de aniversário"

Num instante já estava a trocar novas impressões com um casal da Estónia que estava impressionado por visitar um museu e poderem viajar num eléctrico do século passado. Foram os visitantes que provavelmente demoraram mais tempo a visita onde contemplaram um por um cada um dos veículos expostos, talvez imaginando como seriam as viagens à época. 

De Inglaterra chegavam minutos depois, dois entusiastas interessados por autocarros de dois pisos e entre conversas de autocarros e eléctricos chegaria a pausa para almoço.

Ao longo do dia, as visitas foram aparecendo umas atrás das outras o que acabou por me surpreender e ainda bem, pois é sinal que ainda há muita gente interessada pelo mundo dos transportes e prova disso foi também a visita de dois colegas dos STCP que também desfrutaram de uma visita que acredito, tenha sido uma verdadeira viagem no tempo.

Virar o trolley, pegar nos manípulos e mudar de plataforma. Há mais quatro clientes para apanhar no núcleo 1. Chegam de Madrid e ao recebê-los dizem-me de imediato "estamos encantados por este museu", e quando os convido a subir ao eléctrico "São Luís", ficam surpresos com a viagem que os leva ao parque onde autocarros e eléctricos os aguardam. Deixo-os à vontade explicando o que se seguia e no fim da visita quando os apanho de regresso até à saída, o senhor diz-me que "maravilhoso é este espaço. Todos los tranvias circulam?", explico-lhe que os que estão na primeira parte ligados à rede sim e que saem anualmente durante o desfile comemorativo do aniversário da empresa, juntamente com o autocarro laranja e o verde de dois pisos. Ficou admirado!

Percebi que o senhor era mais que entusiasta pelo que me ia falando, sobretudo sobre autocarros e suas marcas, até que me diz que era responsável pelo parque de exposição do museu dos autocarros de Madrid, da EMT. Escusado será dizer que tivemos conversa até ao fim da visita cujo a temática foi claro está, autocarros. No fim agradeceram imenso e disseram que o museu estava muito bom. 

Até ao fim do dia, vieram ainda mais, um casal e um jovem entusiasta, que acompanhado da sua tia acabou por fazer uma visita rápida porque já é cliente habitual e talvez tenha aproveitado a oportunidade para ver a nova maqueta do novo eléctrico articulado da CAF, à escala 1/25 que já está exposta no núcleo 1 do museu.   

Chegava então ao fim um dia de trabalho diferente e naquele que considero ser o meu mundo. Não sei se lá voltarei ou quando voltarei, mas acho que cumpri e bem a minha missão, porque quando se faz o que se gosta tudo é mais fácil, mas não quero deixar de agradecer ao João Alberto, meu colega de formação que já por diversas vezes realizou lá serviço e me deu dicas importantes, assim como agradecer a toda a equipa administrativa do Museu, por tão bem me receber e deixar à vontade, no desempenho das minhas funções enquanto guarda-freio do Museu, pelo menos por um dia. 

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