sábado, 30 de maio de 2009

Adoramos & Detestamos

Cada bairro é feito de histórias. Das casas que o caracterizam, do passado, dos seus monumentos e sobretudo das pessoas. São elas que “criam” uma imagem mais real de cada lugar e que mostram a personalidade de cada bairro. E é também através das pessoas que nós, motoristas e guarda-freios temos contacto directo com esta cidade das sete colinas – Lisboa...

De Algés ao Prior Velho, passando pela Graça e Moscavide, a rede da Carris percorre ruas e ruelas, avenidas e estradas, sítios e bairros, como o do Casalinho ou do Calhau. Em cada lugar pessoas comuns marcam a diferença entre bairros. Seja pelas expressões que utilizam ou pela simpatia que os caracterizam.


Seja de autocarro ou de eléctrico, de ascensor ou até elevador é com as pessoas, que os tripulantes da Carris contactam directamente no dia-a-dia. Uns mais habituais e outros ocasionais, lá vão entrando e saindo ao longo das 24 horas. E muitas das vezes nem é preciso atingir as 8 horas de serviço, para que se fixe diversas situações e muitas delas que originam verdadeiras histórias, que contadas ninguém parece acreditar.

Muitas delas já por aqui passaram, e muitas mais há para contar até porque a minha estadia na Carris só leva ainda dois anos. Há no entanto, situações que presenciamos no nosso dia-a-dia e que partilhamos com colegas nas chamadas «conversas de corredor» - aquelas que surgem ao acaso - que acabam por fazer parte de um leque que teria duas faces. Uma mais positiva do que a outra.

Diria mesmo que certas e determinadas situações criadas pelas pessoas e independentemente do bairro ou lugar, adoramos mas outras, detestamos mesmo! Como por exemplo:

ADORAMOS...

“... Quando as pessoas entram e dizem «Bom dia/boa tarde/boa noite sr.(srª.) Motorista/Guarda-freio», provando que ainda há quem se lembre que está ali alguém que lhes abre a porta”

“... Quando perante uma conversa – diria – mais acesa com um passageiro, os restantes colocam-se a do nosso lado, dando-nos a respectiva razão”

“... Quando perante uma interrupção numa carreira de eléctricos, vem o «Chico esperto» perguntar ao guarda-freio porque não se desvia”

“... Quando perante uma interrupção na carreira 35, vem alguém à janela dizer que «o outro já passou antes», como que se fosse vontade nossa ficar ali parado à espera do reboque”

“... Quando os passageiros mais corajosos «explodem» para denunciar que há carteiristas a bordo”

“... Quando o odor no autocarro é intenso, alguém entrar de seguida com um cheiro bastante agradável, mas nunca com banhos de perfume que acabam por se tornar enjoativos”

“... Quando os passageiros entram em guerras para ceder o lugar a quem entrou mais necessitado. Há sempre uma que tem uma prótese no joelho, ou outro que foi operado à coluna. Ah mas há também aqueles que dizem «A senhora não sabe a doença que eu tenho para falar assim...» e enquanto isto se passa, já uma fila enorme, está atrás da pessoa que aguarda pelo lugar”

“... Quando numa manhã de serviço na 79 ou na 18E aparece a «tia Maria» com um bolinho e um suminho para compor o estômago, e se recusamos fica mesmo chateada”

“...Quando os outros utentes da via, ao verem o amarelo do eléctrico ou do autocarro aceleram para passar á frente e depois não têm espaço suficiente para retomarem a sua via”

DETESTAMOS...

“... Quando perante uma rua estreita ou lugar com um carro mal estacionado, alguém aparece a dizer «passa, passa. Pode ir que já passou», pensando eles que o autocarro ou o eléctrico é uma caixa de fósforos”

“... A presença dos carteiristas que entopem as passagens – sobretudo nos eléctricos - para ganharem terreno de actuação”

“... Os odores insuportáveis que alguns passageiros transportam. Não se justifica nos tempos que correm e além disso a água e a higiene não fazem mal a ninguém”

“... Quando os passageiros dizem que mudámos as bandeiras a caminho, quando se apercebem que de facto se enganaram”

“... Quando os passageiros não têm humildade suficiente para dizerem que se esqueceram de tocar a campainha e dizem «eu toquei... você é que não viu porque vai a dormir», e neste preciso momento em que terminam de falar ouve-se a campainha tocar”

“... Quando chegamos a uma paragem e vimos uma longa fila de passageiros e todos eles com uma vontade enorme de atribuir culpas ao motorista pelo atraso”

“... Quando depois de uma hora à espera do reboque, por causa de uma viatura mal estacionada, aparece primeiro o dono do carro, com ar descontraído e com ar de quem tem razão. Pois o autocarro ou o eléctrico é que não deviam ali passar”

“... Quando alertamos os passageiros sobre determinadas situações, como por exemplo os carros de bebé que fazem de carros de supermercado, e estes respondem dizendo que «o seu colega não me disse nada, porque é que você me está a chatear?», pobre coitado do colega que é desculpa para o bom e para o mau”

“... Quando as senhoras entram com as malas já nas mãos prontas para esfregarem nas máquinas dificultando assim a entrada dos restantes passageiros e perdendo o dobro do tempo, que se tivessem tirado atempadamente o Lisboa Viva ou o Sete Colinas”

“...Apanhar uma interrupção na ultima viagem antes de recolher, porque o reboque demora sempre muito tempo a aparecer”

E muito mais havia para referir, destas pequenas situações que presenciamos no nosso dia-a-dia, seja na Mouraria, na Bica, em Campo de Ourique ou na Damaia. São estas pequenas coisas que fazem desta profissão, uma profissão diferente de todas as outras, e seja no alcatrão ou nos carris, o certo é que sem as pessoas, sem os bairrismos e sem nós claro, nada disto seria possível.

12 comentários:

Anónimo disse...

"pá!", mas eu não adoro qdo vejo que o autocarro não passa e vem um bimbo dizer que pode avançar que passa, essa deve estar colocada no lado errado,ah! e qdo é o proprio bimbo que tem o carro mal estacionado s´dá vontade é de avançar e espatifar-lhe o carro todo e depois perguntar-lhe: "então não passou porquê ? " e enchê-lo de porrada até ele responder. Mas como o autocarro não é meu :) fica bem

Colega

Rafael Santos disse...

Caro Anónimo e colega :)

Mas essa está no Detestamos... Pois acho que ninguém gosta mesmo, porque é um passar de um atestado de estupidez que só cabe mesmo a quem diz esses comentários .

Abraço

Anónimo disse...

enganei-me a q eu queria referir era esta :"Quando perante uma interrupção na carreira 35, vem alguém à janela dizer que «o outro já passou antes», como que se fosse vontade nossa ficar ali parado à espera do reboque”, esta é q não adoro como tu. :-)

Rafael Santos disse...

Mas essa está no adoramos mmesmo pelo sentido irónico da questão. Porque de facto quem diz isso obviamente que não sabe a brecagem que o carro tem, etc... Mas ok, fica registado :)

Abraço

N1981S disse...

caro colega. boa tarde.

subscrevo que hoje a educação já não e o que era.
Há mais carros a circularem, e menos paciencia para procurar um lugar para estacionar.
Carreiras como a 35, 31, 30, 702,etc, nós motoristas, deveriamos circularmos com 1 autocarro que tivesse umas pás a frente como um limpa neves.

abraço Nuno

Rafael Santos disse...

Boa Tarde Nuno,

Se era bom e ás vezes o mesmo era necessário para o interior dos autocarros quando as pessoas teimam em entupir o corredor, quando à espaço na rectaguarda. Lá está parte tudo do mesmo! Falta de civismo :)

Abraço

André Bravo Ferreira disse...

Acho que também odeiam quando algumas carreiras partem atrasadas e os passageiros reclamam que "Já tem o nosso dinheiro, agora fazem o que querem!".
Hoje fartei-me de ouvir essa.

Não fui o mais rápido, desta vez ;)

Grande abraço.

André Bravo Ferreira

Anónimo disse...

essa de "já terem o nosso dinheiro" é um "habitué", se as pessoas pagassem o valor que realmente deveriam pagar pelos passes e bilhetes aí se calhar poderiam reclamar mas com a ninharia que custam os passes, ( e por isso é q se chamam passes sociais ,pagamos todos nós contribuintes ) não vejo cabimento para esse tipo de reclamação. O q o governo devia fazer era cada um pagar o passe consoante o ordenado ou pensão q recebe porque há reformados q têm boas pensões e pagam meia duzia de euros pelo passe e andam o dia todo a passear no autocarro e ainda reclamam.
Se calhar um dia o desejo de muitos destes "velhos do restelo" ainda se concretiza e a carris é privatizada, pensando estes que é o melhor para todos, mas eles que vejam como estão as outras empresas privadas do sector quer para os passageiros como para os seus colaboradores e tirem daí as suas conclusões...mas como burro velho não aprende.
desculpa o testamento.
colega.

André Bravo Ferreira disse...

Concordo contigo Anónimo, sei do que falo, ando num empresa privatizada do sector e não tem nada a ver com a Carris, condições, preços dos bilhetes, horários, etc etc etc.

Grande Abraço.

André Bravo Ferreira

APS disse...

Caro Rafael Santos

Adoramos... e Detestamos...

Isto é a história do dia a dia de um cidadão atento, dirigindo um autocarro da «CARRIS», pelas dificeis mas graciosas, RUAS DE LISBOA.

Um abraço!
APS

pum disse...

Bem não percebo nada de autocarros, eu é mais medicina mas de qualquer forma axei imensa piada ao teu blogue e á maneira como descreves a tua profissão é sempre bom saber um bocadito de todas as profissoes k fazem da nossa vida o que ela é. Eu ando de transportes mas tenho medo de andar de autocarro (pronto sou maricas :P) mas voces andam tão depressa LOOOL. bjinho vou seguir o blogue :P

Rafael Santos disse...

da cor da imaginação.C.V.M. , Bem-vinda!

Já agora como chegaste até aqui??? De autocarro? :)

Boas viagens pelo blog!!!

Rafael Santos

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