Os nossos queridos passageiros nunca estão satisfeitos com o serviço prestado. Se o carro vem atrasado reclamam que «é sempre a mesma coisa....», se o carro vai adiantado é porque «andam a acelerar e agora vamos ter de esperar mais tempo pelo barco porque vamos chegar cedo de mais». Depois há a questão do ar condicionado. Se funciona em condições, é uma alegria para uns e um desagrado total para outros. Se as janelas vão abertas, alguém as quer fechadas e se o calor aperta como foi o caso de hoje, há quem não queira outra coisa se não ar condicionado. Na verdade o stress diário acaba por ser descarregado em minutos numa deslocação, num transporte público onde até há um motorista ou guarda-freio que já está habituado a ser o muro das lamentações, críticas, reclamações e de vez em quando alguns elogios.
Contudo o meu serviço de hoje foi na carreira 15E e o contacto com os passageiros esteve limitado, dado que a minha chapa circulava com um eléctrico articulado que até tinha um bom ar condicionado. Mas claro está que uma interrupção acabaria por originar de imediato esse contacto. Através do sistema de comunicação com o interior do veículo, informo os «senhores passageiros que devido a uma interrupção após a zona de Belém, este eléctrico vai terminar a sua viagem na próxima paragem. Pedimos desculpa pelo sucedido. Obrigado.»
Entro na raquete de Belém e aguardei ordens da Central de Comando de Tráfego, já depois de todos os passageiros terem abandonado o eléctrico. Cinco minutos passaram e o rádio voltava a tocar... «Sr.Guarda-Freio, o percurso está restabelecido. Siga para Algés. Termino.» Inicio então viagem novamente com destino a Algés e quando eu pensava que todos os passageiros que minutos antes tinham saído iriam ficar satisfeitos por prosseguir viagem até Algés, eis que o oposto se instalou naquela paragem dos Jerónimos e até maluco me chamaram.
Dei comigo então a pensar se aquelas pessoas, sabem realmente qual o nosso trabalho e missão enquanto tripulantes de um transporte de passageiros. Mas afinal de contas, que prazer daria a um condutor de um transporte público que as pessoas saíssem todas para minutos depois voltarem a entrar? E não seria pior se tivessem ficado sem transporte que as levasse até Algés? É caso para dizer que «é preso por se ter cão e preso por não se ter...»
E lá seguimos a viagem até... à Rua de Pedroços. O descontentamento no interior do eléctrico relatava que era «todos os dias a mesma coisa» e «parece que andam a brincar com as pessoas». Mas de repente o eléctrico é obrigado a parar e a tocar a campainha na esperança de aparecer o dono do carro que impedia a continuação da viagem. Acabavam então as criticas ao serviço e apontavam «as armas» para quem pensa só no seu umbigo. O dono teimava em aparecer até que uma das senhoras diz que «devia era ser levado à frente.»
E se minutos antes todos estavam contra mim, naquele instante, todos eram meus aliados até passar um 729 que os levou até ao destino. 15 minutos depois lá apareceu não a dona do carro, mas um senhor que nem sequer sabia ligar o carro. Agora digam lá quem é que consegue cumprir horários quando ninguém respeita o próximo, numa cidade que se parece cada vez mais com uma república das bananas...
3 comentários:
Adoro ler este blog, tem histórias muito engraçadas, mas não deixo de ficar curioso:
Como se resolveu a situação, já que o senhor que apareceu, aparentemente, não sabia conduzir??
Acabou por conseguir ligar o carro e subir com o rodado traseiro o lancil do passeio e foi o suficiente para o Eléctrico prosseguir viagem.
:)
Assim a ler dá muita vontade de rir, mas acredito que na altura nem por isso. É caso para dizer "ainda bem que ia protegido num articulado", caso contrário, teria tido a sua vida em (sério) risco :-)). Acho que a maior parte das pessoas não têm a noção de que os motoristas recebem diariamente instruções para proceder de uma maneira ou de outra maneira:-)
É semelhante à situação que por vezes sucede de quando o autocarro rende de motorista e também encurta o percuso; uns têm o cuidado de avisar os passageiros, outros nem por isso. Ou então quando pedem às pessoas para sairem de um autocarro e entrarem num outro porque aquele passa a "reservado". As pessoas reagem sempre mal, mas apenas estão a cumprir ordens... É preciso muita paciência.
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