sexta-feira, 27 de outubro de 2023

E assim vão as viagens em dias cinzentos pelas ruas de Lisboa

Os dias passam, as semanas também e com eles os meses e os anos. No entanto actualmente vivemos tempos em que tão depressa parece que o tempo voa, como ao mesmo tempo parece custar uma eternidade a passar. A vida fervilha entre o vai e vem no meio de uma cidade cada vez mais caótica e sem regras, com obras e desvios, com atrasos que nos desgastam dia após dia. Dias emq ue cada vez mais trabalhamos para sobreviver e não para viver. 

Trabalho há 16 anos na Carris, faço algo que realmente gosto, conduzir eléctricos e autocarros, mas aquele entusiasmo e motivação que me fazia querer que as folgas passassem rápido, perdi-o algures por aí. Chego ao fim do serviço e só quero é regressar rapidamente a casa para descansar, e tudo do resto do dia, já deixou quase de ser história para contar, porque já ali estou apenas porque gosto do que faço, apenas isso.

Há dias li um comentário na página do facebook do Diário do Tripulante de um ex-colega com quem ainda trabalhei e que desde cedo foi lendo o que por aqui tem vindo a ser escrito e comentava ele numa das últimas publicações que "recordo-me de textos mais elaborados, com metáforas, trocadilhos, adornos, etc. Agora vejo reticências e isso deixa-me triste", disse. Também eu sinto essa tristeza, não uma, não duas, mas muitas vezes.

Continuo a "vestir a camisola" como sempre o fiz desde o primeiro dia em que entrei na Carris, continuo a gostar da Carris, mas hoje a Carris está diferente. Hoje não sinto aquela camaradagem que havia, não há por vezes um cumprimento entre colegas, não há motivação, não há muitas das vezes respeito, não há o que havia e que deixou de haver...

O que me prende? Gostar do que faço por muito que isso seja por vezes incompreendido por muitos, ou uma aversão para outros. Continuo a ser pontual, a não faltar, continuo a ser eu, como sempre me conheceram, mas que vale isso hoje em dia? Isso mesmo... nada. Há dias em que paro e penso, "será que vale a pena?" Sim vale sempre a pena, nem que seja pelo nosso brio profissional, pelo nosso sentido de responsabilidade, pelo nosso carácter.

Factores internos e externos são a causa de um descontentamento que nos faz até afastar da blogosfera. A cidade que em vez de facilitar complica os transportes públicos, com corredores bus a serem eliminados, com falta de policiamento, com falta de regras, com desvios e mais desvios, com supressão de linhas e encerramentos de ruas. Os salários desajustados sobretudo após a inflação verificada e que nos fazem ver que somos realmente mal pagos, mas que ninguém quer saber. Basta comparar os recibos de vencimento de 2007/08 com os de hoje.

E no fim disto tudo pergunta o leitor... "Então mas porque ainda continuas ai?" Porque gosto do que faço, porque dá-me gozo conduzir eléctricos e porque apesar de tudo gosto da marca e da história, sim da história da Carris. Porque estou perto de casa. Quanto ao presente, bem esse é um dia de cada vez e de preferência que passe bem rápido, porque as pessoas hoje em dia não são como eram, porque o serviço publico hoje em dia é mais serviço turístico e de pé descalço e porque são cada vez mais os números que interessam, seja ou não o serviço bem feito. 

E assim vão cinzentas como o tempo, as viagens pelas ruas de Lisboa...

1 comentário:

Anónimo disse...

Compreendo perfeitamente! Também trabalho nos transportes públicos de Lisboa. É cada vez mais desmotivante o trabalho que fazemos, as pessoas com quem nos cruzamos, o turismo sem fim. As coisas pioraram e muito nos últimos anos, e nem uma pandemia nos deixou a olhar para a vida e para o próximo de uma forma mais empática… resta-nos esperar que o turno passe depressa e sem ocorrências! Um abraço

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